Por Hernâni Oliveira
De
acordo com pensamento de Harvey (2013), a cidade como construção/invenção
humana tem suas regras desenvolvidas pelo interesse do “coletivo” e quando não,
deve-se muda-la, pois a liberdade da cidade em mudar tem que ser pautada pelo
desejo de todos. O direito a cidade não pode ser entendido como algo individual
mais fruto da necessidade coletiva. Essas premissas entram em conflito com os
interesses dos capitalistas.
A
cidade é um local de conflito, seja pela estratificação social ou mesmo pelas
diferenças inerentes nos seres citadinos. O espaço urbano sempre fora um local
de visíveis contrastes e desigualdades, se de um lado você tem prédios luxuosos
de outro resplandece barracos das favelas. Dessa forma o conflito urbano é
caracterizado pela disputa das riquezas das cidades, de um jeito que os locais
onde são construídas as moradias da massa trabalhadora ficam distantes dos
centros urbanos e de seus locais de trabalho, e ainda apresentam baixos padrões
de habitabilidade (KOWARICK, 1993).
Recentemente
vários municípios brasileiros vivenciaram os conflitos que foram gerados pela Copa
do mundo em 2014, onde os interesses dos neoliberais da FIFA se chocaram com
direitos de civis pobres, oprimidos e despossuídos que tiveram seu direito de
ir e vir usurpado, entre outros males, como relata Pires (2014).
Outro
exemplo de que a elite sempre sai ganhando e os pobres perdendo, ocorreu na
desocupação do terreno do Pinheirinho (São José dos Campos – SP) em 2012, onde
várias famílias foram expulsas de seus casebres quando o falido especulador
libanês, Naji Nahas, exerceu seu direito de reintegração de posse. O fato que
aconteceu em Pinheirinho mostra que o direito à cidade é de poucos, mesmo Nahas
devendo ao Estado de São Paulo, o mesmo foi socorrido pela justiça e pela força
militar governamental que fizeram valer, assegurando o direito de alguém que
fez parte da elite e ainda tem suas reservas e influências. Talvez mesmo se
Nahas tivesse a posse apenas daquele terreno a ação teria sido a mesma, pois o que
estava em jogo ali era o princípio da propriedade privada que deve ser mantido
a todo custo, porque a moda da ocupação pode virar um hobby, então eles tinham
que dar o exemplo.
Diante desse cenário, observamos que os três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) sempre irão favorecer os mais abastados, pois onde estiver descansando o capital lá estará a atenção do Estado. Protestar, seja individual ou coletivamente, tem sido algo que os poderes constituintes e a imprensa vem rotulando, tais manifestações em muitas ocasiões são vistas como atos de vandalismo e com o chavão black blocs, ou melhor dizendo, os temíveis mascarados.
As
vias dos centros urbanos são locais onde as massas recorrem ao direito de
reivindicar, protestar e lutar por melhores condições de habitação, transporte,
saúde e saneamento. As vias (ruas) tem uma grande importância, pois são como
veias por onde passa o sangue (dinheiro) da cidade, pará-la com manifestações
afeta o fluxo do corpo estatal, logo atinge o capitalista que pressiona os
governantes para contornar a situação. Medidas truculentas como a utilização de
spray de pimenta, gás lacrimogêneo e balas de borracha são recorrentes para
conter as massas que se deslocam para a rua e onde lá exercem suas
possibilidades de luta.
Lutar
pelo direito à cidade, por meio da mobilização social e da luta política são
formas que precisam ser mais bem trabalhadas para que o desejo da coletividade
sejam ouvidos por aqueles que não querem mudança, pois reza o ditado que em
time que está ganhando não se meche. Por isso se a omissão da maioria continuar
crônica, o tal gigante permanecerá em coma e talvez aquelas manifestações de
meados de 2013 tenham sido apenas mera ilusão de uma doença enraizada desde os
primórdios da humanidade, que vem gerando espoliações generalizadas ao longo
dos anos.
REFERÊNCIAS
MARICATO, Ermínia
et al. Cidades rebeldes: passe livre
e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. 1. ed. São Paulo: Boitempo,
Carta Maior, 2013.
KOWARICK, Lúcio. A Espoliação Urbana. 2. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1993.
PIRES, Artur. A
Copa das violações. Revista Berro, Fortaleza,
ano I, n. 2, p. 8-11, ago./set., 2014.